MENTE INQUIETA

Mente inquieta

Esse blog existe desde março 2009 (o domínio antigo era jayetros.blogspot) e como estamos em 2021 isso significa que ele já tem 12 anos. 12 anos! Eu já fui muitas pessoas aqui, já quis ser muitas pessoas e ás vezes me pego lendo as postagens de um menino de 20 anos cheio de sonhos e traço um paralelo da pessoa que hoje me tornei e fico perguntando a mim mesmo o que o eu daquela época diria para o eu de hoje.

Bem, eu sou o Jay e atualmente tenho 33 anos. Sou fisioterapeuta formado e uma pessoa naturalmente inquieta, questionadora e barraqueira quando tem que ser. Nasci sob o signo de leão e talvez venha daí o meu ser temperamental e dramático. No futuro quando for mudar o layout pela milésima vez talvez essa descrição já seja outra. Num resumo bastante sucinto é isso.

sexta-feira, 4 de março de 2011

    
Escrever acima de tudo é um ato de coragem. Coragem de se expor, de se arriscar. De olhar para dentro de nós mesmos e descobrir o outro, porque não existimos sem essa relação. Escrever é uma forma de falar aquilo que não pode ser dito, é mostrar o que muitas vezes não queremos em nós mesmos. É dar para o leitor como um presente feio e sujo uma coisa que escondemos sem querer nada em troca.  
    Escrever é não deixar que o outro caia sobre nossas costas, porque o verdadeiro escritor é aquele que usa as palavras para se denunciar. Para denunciar o que o leitor nunca teria coragem de falar. 

      Sabe aquelas pessoas que vivem grudadas umas nas outras soltando palavras irritantes, que ficam falando de sua vida fútil, se auto-firmando e mostrando que são melhores e superiores que todas as pessoas do mundo. Eu sempre fui diferente, nunca gostei de nada convencional, nunca gostei de rotina e nem nasci grudado em ninguém.  Nasci sozinho, e sempre fui assim até onde eu sei, me acostumei ao silêncio fúnebre dessa casa, uma coisa que me incomoda tanto. Perdi as contas de todas as vezes que da sala eu consegui ouvir o som da torneira pingando no banheiro. De todas as pessoas que eu detestava o silêncio, meu padrasto era a pior delas. Ele e minha mãe tem é pena de mim, mas eu também tenho pena deles. Tem dias em que eu acordo e minha vontade é dizer: “Não se preocupem, podem me mandar embora se não gostaram da mercadoria”.
    Mas pena, pena mesmo eu tenho da minha mãe, ela se esforça para achar alguma coisa boa em mim, pelo visto ela nunca vai encontrar. Meu irmão se acha o dono do pedaço, faz uma merda de um trabalho, ele sim é a espécie de filho imbecil que todos os pais querem ter. No fundo a única pessoa estranha aqui sou eu, que não pertenço a essa casa. E perceber isso é mais que uma surpresa, é um choque.
     Engraçado isso porque agora eu me lembro de quando eu era pequeno, chorava horrores quando minha mãe me mandava dormir na casa de um amiguinho do colégio. Tentando me fazer interagir com as pessoas. Eu ficava imaginando mil motivos para ela ter me despachado, passava a noite em claro esperando o dia chegar, ansioso para receber um abraço dela. A primeira vez que eu usei pó eu também me lembrei disso. Lembrei do dia que fui obrigado a sair daqui, na hora do “barato” minha vontade era a de sair correndo de volta para cá, mas eu não saí, eu não chorei, eu não pedi para parar de usar. Eu fiquei ali e agüentei. Mas naquela hora era só na minha mãe e no silêncio infernal dessa casa que eu me lembrava.
     Passei uma temporada morando com meu pai, mergulhei no teatro de corpo e alma e em pouco tempo aquele menino tímido já tinha adquirido confiança para sorrir e se apresentar para as pessoas. De resto uma imagem bagaceira, sem sex appeal, muita insatisfação e o medo de não agradar, mas eu sabia que estava para melhorar. As pessoas pagavam para ver.  Conheci muita gente importante na minha vida nessa época, gente que carrego comigo até hoje, a época em que eu sai de casa me fez crescer muito.
Arrumei um emprego e quando recebi meu primeiro salário peguei todos os DVDS que eu queria e pensei:”Quer saber? Vou levar tudo é a primeira vez que compro alguma coisa com o meu próprio dinheiro” Pela primeira vez na minha vida sentia que estava fazendo sucesso, continuei estudando teatro e fiz meu primeiro grande personagem, a temporada da peça foi um sucesso. Eu tinha alguma coisa que interessava as pessoas e a noticia começou a correr. Algumas pessoas me diziam que no começo todo novato ia bem, mas eu tenho que confessar: Estava adorando ser o garoto mais popular do colégio.
     Fazer teatro é como ir a um motel, tem uma enorme rotatividade e dá todo tipo de gente. E se você é esperto, você tenta entender o estilo de cada um. Mais uma coisa é certa ,apesar de ter de tudo, todos  queriam a mesma coisa: Serem tratados como uma pessoa especial, queriam atenção. Dizer que nessa altura da minha vida eu tenho medo de errar seria tão falso quanto dizer que eu tenho vontade de continuar aqui. Dá vontade as vezes de sumir no mundo sem ninguém saber, e acordar no dia seguinte só para ter o prazer de dizer ao meu padrasto o quanto eu o detesto.  Queria ter mais dinheiro, dinheiro não aceita desaforo, queria ganhar na
rotatividade, assim aos montes. Estou no caminho certo eu sei, estou cercado de pessoas que me amam. Mas eu me defendo, geralmente eu só faço merda quando me tratam muito bem.
     Não estou reclamando da vida e nem nada, não estou triste ou revoltado. Todo mundo é legal comigo, mas às vezes eu gostaria que as pessoas tentassem me entender. O maior motivo de querer sair daqui é para não ter que depender de ninguém, é para ter a minha própria vida. E eu não quero ir para esse mundo que todo mundo me convida, porque esse mundo não existe. Não existe um príncipe encantado que vai me salvar, no meu mundo nada disso existe. Poucas pessoas sabem disso mas eu sempre passo o natal sozinho, nessa época todo mundo viaja. E eu fico imaginando todos juntos, todos felizes sem mim. Eu sinto saudade deles, principalmente do meu pai, que eu nunca conheci. Mas eu não me sinto culpado por nada, nem das brigas, nem da revolta e nem das drogas. Se não fosse desse jeito eu não tinha amadurecido, aprendido a me cuidar. Aprendido a gostar de mim como sou, hoje eu tenho certeza que foi assim que aprendi a não julgar, aprendi a aceitar as pessoas como elas são, como elas conseguem ser. Conheci todo tipo de gente boas e más. E é por isso que escrevo para você agora, seja lá você quem for. Vivendo tudo isso eu fiquei menos egoísta. Talvez se não tivesse sido expulso de casa, tudo seria normal. O Jay nunca teria existido, só o Renato. E só o Jay poderia chegar a essa conclusão, nunca o Renato. Eu fiz uma promessa a mim mesmo, só vou deixar essa vida que levo hoje depois que juntar uma grana para ficar tranqüilo, eu sei que nasci para isso, para estar lá na frente dos refletores. E se um dia eu tiver de deixar de fazer o que eu amo fazer, eu quero sair do mesmo jeito que entrei: assumindo que foi uma escolha que eu fiz.

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